Um dos primeiros pontos que surpreendem advogados é que o direito de usucapião não deriva de nenhum título anterior. Ele é considerado um direito originário, pois, após o cumprimento dos requisitos legais, confere ao possuidor o direito pleno sobre o bem. Isso significa que o proprietário anterior perde totalmente o vínculo com o imóvel.
A natureza autônoma do usucapião implica que, para adquirir o imóvel, não é necessário verificar a legitimidade do título de propriedade anterior. Ou seja, independentemente de o proprietário anterior ter ou não um título válido, a posse prolongada e legítima dá ao possuidor a chance de obter o domínio total do bem.
Essa característica torna o usucapião um instituto especial no Direito Civil, capaz de restaurar o equilíbrio social ao dar legitimidade à posse justa e prolongada.
Outro fato que surpreende muitos profissionais do direito é a variedade de modalidades de usucapião. Existem diferentes formas, cada uma com requisitos próprios e prazos variados. As mais comuns são a usucapião ordinária, extraordinária, especial urbana e especial rural.
Por exemplo, a usucapião ordinária exige que o possuidor tenha boa-fé e um justo título, além de um prazo de posse de dez anos. Já a usucapião extraordinária não exige justo título nem boa-fé, mas o prazo mínimo de posse aumenta para 15 anos.
Conhecer as diferentes modalidades e seus requisitos é essencial para assessorar clientes de maneira precisa e maximizar as chances de sucesso em um processo de usucapião.
Para que o usucapião seja considerado, é essencial que a posse do bem seja contínua e sem interrupções. Isso significa que o possuidor deve exercer atos de posse de forma pública e visível, sem contestação de terceiros ou do proprietário.
Essa continuidade é o que demonstra o interesse do possuidor pelo imóvel, tornando-o merecedor do direito de propriedade. Qualquer interrupção ou disputa que interfira no uso do imóvel pode comprometer o prazo e inviabilizar a obtenção do direito por usucapião.
Em um processo, comprovar essa posse ininterrupta pode ser um desafio, e é fundamental que o advogado instrua o cliente sobre a importância de manter registros e testemunhas que comprovem a ocupação contínua.
Boa-fé e justo título são requisitos em algumas modalidades de usucapião, especialmente na usucapião ordinária. Boa-fé significa que o possuidor acredita ser o verdadeiro proprietário do imóvel e agiu sem intenção de lesar o dono legítimo.
O justo título é um documento que, embora não valide a propriedade de fato, faz com que o possuidor acredite ser o dono do bem. Esse título pode ser um contrato de compra e venda, um recibo ou outro tipo de acordo informal.
Para um advogado, comprovar boa-fé e justo título pode facilitar o processo, mas esses elementos nem sempre são necessários, especialmente em casos de usucapião extraordinária, que prescinde desses requisitos.
O conceito de função social da propriedade é fundamental no contexto do usucapião. Em termos simples, esse princípio determina que a propriedade deve cumprir um papel útil para a sociedade, e a posse prolongada pode ser uma maneira de garantir esse papel.
Um imóvel abandonado, por exemplo, não cumpre a função social esperada. Nesse caso, o usucapião pode servir para transferir a propriedade a alguém que esteja disposto a dar utilidade ao imóvel.
Assim, o usucapião representa uma forma de regularização fundiária e de efetivação de um direito social, permitindo que imóveis ociosos sejam destinados a pessoas que realmente farão uso deles.
Muitos advogados ainda desconhecem a possibilidade de realizar o usucapião extrajudicialmente, um processo que vem ganhando força e que permite uma solução mais rápida e menos onerosa para o cliente.
Desde 2015, a Lei n.º 13.105 do Código de Processo Civil possibilita que o usucapião seja requerido em cartório, evitando a morosidade do Judiciário, desde que todos os interessados estejam de acordo e não haja oposição do proprietário.
Essa alternativa exige a participação de um advogado para instruir o pedido e reunir a documentação necessária, além de uma atuação estratégica para garantir que o processo ocorra sem percalços e dentro dos requisitos exigidos.
Para comprovar a posse prolongada e os demais requisitos do usucapião, a documentação é vital. Fotografias, recibos de pagamento de impostos, contas de serviços públicos, testemunhos e outros documentos que atestem o uso contínuo e público do imóvel são fundamentais.
Documentar cada ato relacionado ao imóvel aumenta consideravelmente as chances de sucesso no processo, pois são provas cabais de que o possuidor se comportou como proprietário durante o período exigido pela lei.
O advogado deve orientar o cliente a reunir esses documentos desde o início, montando uma narrativa sólida que favoreça a concessão do usucapião.
Testemunhas que possam confirmar o uso contínuo e o domínio sobre o imóvel são essenciais para comprovar a posse no processo de usucapião. A presença de vizinhos, amigos ou antigos moradores pode ser decisiva para o resultado do processo.
Essas testemunhas podem atestar, por exemplo, que o possuidor é responsável pela manutenção do imóvel, pela realização de melhorias e pelo pagamento de despesas relacionadas à propriedade.
Para garantir uma prova sólida, o advogado deve orientar as testemunhas sobre os detalhes que precisam ser abordados, preparando-as para o momento da audiência ou da declaração formal em cartório.
O usucapião é amplamente utilizado como um mecanismo de regularização fundiária, principalmente em áreas urbanas e rurais onde há concentração de imóveis irregulares. Por meio do usucapião, pessoas que ocupam terrenos ou imóveis sem documentação podem regularizar sua situação.
Esse processo tem um impacto social significativo, pois permite a formalização de propriedades que antes estavam fora do sistema oficial, trazendo segurança jurídica e possibilitando que o possuidor tenha acesso a financiamento e crédito.
O advogado pode auxiliar nesse processo, orientando o cliente sobre os passos necessários para obter o usucapião e garantindo que a documentação e os prazos sejam cumpridos corretamente.
Uma modalidade de usucapião pouco conhecida, mas extremamente útil, é o usucapião familiar. Ele permite que o cônjuge que permaneceu no imóvel, após abandono pelo outro cônjuge, obtenha a propriedade plena do bem.
Esse tipo de usucapião requer um prazo mínimo de dois anos de posse direta e exclusiva, além da comprovação de que o outro cônjuge abandonou o imóvel de forma voluntária. É uma ferramenta poderosa para proteger o possuidor abandonado.
Advogados que lidam com questões familiares precisam conhecer essa modalidade para poder orientar adequadamente clientes em situações de abandono e garantir que seus direitos sejam protegidos.